Os cosméticos são os produtos mais consumidos no mundo, dentre eles destacam-se os xampus e os condicionadores, por serem de produtos de higiene pessoal e de uso rotineiro. Com a dinamicidade e inovação do mercado cosmético, os consumidores estão cada vez mais exigentes sobre a composição química dos produtos que estão consumindo, preocupando-se não só com a qualidade do produto, mas também com o impacto na sua saúde e meio ambiente.
Nesse contexto, os produtos fabricados em meio aos novos conceitos produtivos inspirados pelo movimento da “Química Verde” e demais movimentos em defesa de uma sustentabilidade ambiental, os chamados “bioprodutos”, ganham espaço.
A Química Verde é um ramo da Química que busca diminuir ou eliminar o uso de substâncias que promovem poluição, bem como recuperar a qualidade do meio ambiente.
Um dos bioprodutos que vêm ganhando destaque são os xampus e condicionadores sólidos, conhecidos como xampus e condicionadores “em barra”.
Embora não seja uma novidade, já que há registros de comercialização de modelos sólidos desde a década de 1970, eles têm se popularizado muito entre os usuários que procuram inserir iniciativas mais sustentáveis no seu dia a dia, mesmo sendo uma forma mais inusitada de utilizar tais cosméticos. Esse hábito está mudando a rotina desses indivíduos.
Os xampus tradicionais disponibilizados no comércio utilizam em suas composições uma diversidade de produtos químicos sintéticos industrializados, como surfactantes aniônicos (surfactantes com uma estrutura molecular maior como Sodium Lauryl Sulfate e Sodium Laureth Sulfate (SLS), que são considerados produtos com poder limpante maior, são muitas vezes mais abrasivos ao fio de cabelo, deixando cargas elétricas negativas na superfície capilar, o que leva a um cabelo com frizz. Os xampus sólidos tendem a utilizar mais surfactantes anfóteros e catiônicos, que possuem uma capacidade limpante menor, porém levando a menos dano na superfície do fio.
Além disso, os produtos tradicionais são formas líquidas ou viscosas, e podem ter em sua composição até 90% de água, enquanto os mesmos produtos sólidos são feitos com o uso de substâncias de origem natural. Isso faz com que os xampus sólidos sejam menos agressivos aos fios e couro cabeludo.
Uma vantagem na iniciativa de trocar o uso de xampus e condicionadores nas apresentações tradicionais por produtos na forma sólida é a redução do consumo de plástico, usual embalagem dos xampus e condicionadores líquidos.
Estima-se que cerca de 8,3 milhões de plásticos chegam aos oceanos anualmente, de acordo com a ONU Meio Ambiente, o que prejudica centenas de espécies marinhas. Além disso, os resíduos plásticos também podem contaminar os solos se não forem descartados e tratados corretamente, uma vez que os plásticos podem levar centenas de anos para se decompor.
Alguns cosméticos em barra também podem ser produzidos de forma que sejam classificados como Veganos (sem nenhum ingrediente de origem animal) e/ou Cruelty Free (não testados em animais) e podem contar com embalagens que podem ser tanto de papel reciclável ou apenas de um pequeno embrulho de papel celofane.
Para quem quer começar a utilizar os produtos em barras, essa troca entre os produtos tradicionais e os sólidos deve acontecer preferencialmente utilizando um método de substituição gradativo, com o objetivo de minimizar alguns desconfortos que possam ser sentidos nessa troca entre um produto com uma concentração maior de química sintética por um produto mais natural.
O processo seria semelhante ao processo chamado “Low Poo” pois também consiste na substituição de produtos tradicionais com presença de sulfato por produto com pouca ou nenhuma presença de sulfatos, fazendo com que os fios se acostumem com as novas composições de uma forma gradual.
Por serem sólidos, esses produtos também são capazes de evitar o desperdício, promovendo ao usuário uma relação de custo-benefício mais vantajosa do que os líquidos usuais. Uma barrinha, por exemplo, dura até 60 lavagens.
Para usar, o consumidor pode esfregar a barra inteira ou um pedaço dela (se o mesmo quiser dividi-la em 3 partes, para durar mais, por exemplo) nas mãos para fazer uma espuma e em seguida aplicá-la na raiz dos cabelos molhados, esfregando e deixando agir por dois minutos.
No caso do condicionador, deve-se esfregar também a barra nas mãos para dissolver o produto e passá-lo no comprimento do cabelo até as pontas. Pode deixar agir por alguns minutos e enxágue depois.
Para o condicionador recomenda-se evitar usá-lo diretamente no couro cabeludo para evitar que o mesmo fique com excesso de oleosidade.
O fato de o xampu em barra ter mais componentes de origem natural não implica no fato de que ele possa ser produzido de forma caseira. Existem métodos específicos, com leis e normas a serem obedecidas para produzir qualquer cosmético a ser utilizado para a segurança do consumidor.
Normalmente quando o cabelo fica sujo, há acúmulo de dois tipos de impurezas: as sólidas e os depósitos mais oleosos. Os depósitos oleosos são formados a partir do acúmulo do óleo natural produzido pelas glândulas sebáceas associadas aos folículos capilares. Já as sujeiras sólidas são resíduos do ambiente, como poeira ou poluição, que se acumulam pela exposição do dia a dia, e podem sair com a água. No entanto, os depósitos oleosos necessitam da ação dos surfactantes (tensoativos) presentes nos xampus. Esses compostos possuem afinidade com substâncias oleosas e concomitantemente à água, facilitando o arraste do óleo pela água quando se enxágua o cabelo.
Existem diferenças de composição na hora de produzir os xampus sólidos. Existem os produzidos a partir de óleos saponificados e os produzidos a partir de surfactantes sólidos. Os xampus em barra feitos a partir de surfactantes sólidos são classificados como “Sem Saponificação” (ou soap free: livre de sabão).
Os xampus sólidos à base de surfactantes são formulados para serem o mais semelhantes possível aos xampus líquidos, só que sem a presença da água na sua composição. Isso pode garantir um menor desconforto na substituição dos produtos líquidos pelo produto sólido, sendo uma boa maneira de iniciar essa troca.
Já os xampus em Barra Saponificados são feitos a partir da reação entre óleos, gorduras e substâncias alcalinas. Esta reação é chamada de saponificação porque é capaz de gerar “sabões” quando a substância alcalina neutraliza os ácidos graxos dos óleos. Então, é possível selecionar os ingredientes da formulação de acordo com suas propriedades, desde propriedades mais detergentes até mais nutritivas para os fios. Ter uma maior concentração de óleos, manteigas e umectantes, por exemplo, pode trazer para o produto um poder maior de hidratação e nutrição. Seria fácil controlar a função do xampu de acordo com os óleos e gorduras saponificados durante a produção. Para isso, é necessário que os produtos formados nesta reação possuam pH alcalino, entre 8-10. Normalmente, não seria um problema, porém para o couro cabeludo sensível e alguns tipos de fios, esta pode não ser a melhor opção, dado que o pH natural dos fios e do couro é levemente ácido.
Além disso, existem locais onde a água possui uma concentração maior de íons cálcio e magnésio. Nestas condições, os shampoos saponificados terão uma performance inferior pois eles não formarão espuma tão bem e estarão mais sujeitos à formação de sais insolúveis que podem aderir aos fios, deixando a sensação de fios pesados.
Considerando que o uso de xampus, como o saponificado, pode aumentar a carga eletrostática do cabelo por causa das substâncias aniônicas e com isso gerar mais atrito nos fios, o uso de condicionadores se torna algo indispensável para a maioria dos tipos capilares. Esse produto geralmente tem a sua atuação conferida por surfactantes catiônicos, que neutralizam os ânions e trazem de volta aspectos como a maciez e o brilho do cabelo. Existem também importantes diferenças entre os condicionadores líquidos e os sólidos.
Os condicionadores líquidos comuns são emulsões em que o ingrediente em maior quantidade é a água, limitando a possibilidade de outros ingredientes que possam agir melhor no fio e necessitando da utilização de várias outras substâncias para manter a estabilidade físico-química e microbiológica do produto.
Para os produtos sólidos é possível notar a presença em maior quantidade do surfactante, que de fato irá agir no cabelo, e uma grande variedade de óleos vegetais que são agentes importantes na lubrificação dos fios. Outro fator importante em relação aos condicionadores líquidos é o uso de quaternários de amônio como surfactante, tendo como o principal representante o Metossulfato de Behentrimonio. Essas substâncias estão em relevância na pauta ambiental por apresentarem toxicidade à vida aquática, biocumulação em espécies de peixes e crustáceos e baixa biodegradabilidade, além de alguns efeitos em seres humanos, como rinite alérgica, dermatite de contato e toxicidade ocular. O grande engajamento ambiental envolvido no uso de condicionadores em barra pode atuar como uma motivação das marcas para desenvolver surfactantes naturais e menos agressivos, como por exemplo o Brassicyl Isoleucinate Esylate (and) Brassica Alcohol, que é um condicionante derivado da fermentação de materiais vegetais.
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Autores: Gabriela W. Schiessl, Clara S. Ferraz, Gabriel Reis, Emeli M. de Araújo e Samanta C. Mourão.
Referências bibliográficas:
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